A despeito da ínfima quantidade de vacinas disponíveis, algumas questões têm sido suscitadas no âmbito do Direito do Trabalho e do Contrato Laboral. A demissão do colaborador por justa causa pode ser justificada pela recusa em receber a vacina? O empregador pode obrigar o colaborador a se vacinar?
Sabe-se que o Supremo Tribunal Federal entendeu que a vacina é obrigatória, porém não pode ser forçada. É verdade que não se tratou de decisão proferida em discussão de assunto propriamente vinculado às relações do trabalho, mas sobre interesses mais amplos.
Inédita recomendação do Ministério Público do Trabalho foi no sentido de que a recusa em aceitar a imunização pelo colaborador legitima a justa causa.
Nos debates mais qualificados a respeito, há posicionamentos contrários a possibilidade da despedida imotivada. Dentre eles, destacam-se, de maneira sintética, os seguintes:
– O direito positivo não prevê obrigatoriedade, o que nos leva a conclusão de existência de uma lacuna e, portanto, como consequência, seria inadmissível para legitimar a justa causa.
– Argumenta-se também que a relação de emprego é um direito fundamental e, frente a isto, a vacinação não poderia ser a condição para a manutenção desse direito.
– Haveria afronta ao direito à liberdade, na medida em que não se pode atribuir eficácia desejada à vacina, ainda mais considerando que a mesma foi aprovada em situação emergencial.
– O empregado não pode ser identificado e diferenciado em razão de ter sido ou não vacinado, ainda mais compelido a informar o empregado se isto ocorreu. Tratar-se-ia de uma discriminação biológica.
A realidade imposta pela pandemia é todos os seus impactos são e serão sentidos, cada vez mais, nas relações sociais e, consequentemente, no âmbito do direito. Mesmo que nenhuma situação concreta tenha sido apreciada pelo Poder Judiciário até o momento, porque não há vacinas para todos, a discussão sobre a questão certamente se intensificará.
A manifestação do Supremo Tribunal Federal feita até agora foi insuficiente para dirimir as dúvidas sobre o tema e há claros sinais de insegurança jurídica, não apenas no futuro julgamento de demandas sobre o tema, mas especialmente como os envolvidos deverão se comportar diante da situação concreta que certamente se apresentará em breve.
Espera-se que os órgãos responsáveis pelo regramento das relações do trabalho sejam capazes de municiar os operadores do direito com diretrizes claras, a fim de que controvérsias sobre a questão sejam mitigadas e exista, em tempo razoável, um posicionamento pacificado sobre o tema. Em outros países vemos iniciativas neste sentido.
Vale lembrar que a negociação e o acordo coletivo podem ser um caminho para que futuras divergências possam ser evitadas.
Será preciso bastante bom senso e serenidade do enfrentamento da questão, não se podendo perder de vista que não apenas as relações do trabalho, mas todas as relações da vida em sociedade, estão diante de inédita e incomum situação.